O golpe: parte 2

De tempos em tempos é notável que costumes de décadas passadas voltem e tornem-se novamente parte do nosso cotidiano. É assim com elementos da música, na moda, da cultura e de tantas outras expressões das relações humanas. No Brasil, nos últimos dois anos, uma prática que voltou com tudo é a de depor presidentes. Talvez ingênuos, pensávamos que isso havia sido deixado na história, na década de 1960.

Alguém poderia imaginar que, no final (será?) dessa bagunça toda que se tornou a política de nosso país, que estaríamos cara a cara com a possibilidade de sermos governados pelo saudoso PFL? O partido que surgiu do final da ditadura, como dissidência do PDS, sustentou Sarney e FHC, experimentou o ocaso e a oposição nos governos petistas e, agora na roupagem de Democratas (DEM), tem no presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, o candidato a substituir Michel Temer na presidência da República. Pelo menos é disso o que falam os jornais desde a última sexta.

Além das denúncias que atingem o presidente e seu entorno, outros fatos demonstram que Michel Temer não deve aguentar muito. No PSDB, principal aliado de seu governo, caciques já não fazem de rogados e dão declarações à imprensa demonstrando que o partido está a desembarcar.

O senador tucano Cássio Cunha Lima teria dito a investidores que, em 15 dias, o país terá um novo presidente, ao passo que seu colega Tasso Jereissati defende que Maia teria apoio para “unir” o país – seja lá o que isso signifique – e seguir com as controversas reformas da área econômica que atingem em cheio os trabalhadores.

Segundo a imprensa, Maia inclusive já tem em mente um novo ministério, com a manutenção de Henrique Meirelles na Fazenda. E da própria imprensa também vem outro sinal ruim para Temer: com exceção do Estadão, os grandes jornais e a TV Globo já não o apoiam e desejam a troca do poder. Demonstram isso ao dedicar boa parte de sua cobertura às denúncias contra o presidente e, agora, para as “maravilhas” de ter Rodrigo Maia na Presidência.

Consagrada essa articulação, é notável que o que existe nisso tudo é um golpe dentro do golpe. É como se a história estivesse sendo contada em uma série de filmes e que esse lançamento poderia ser chamado de “o Golpe: parte 2”, com os mesmos atores, mocinhos (?) e vilões. Triste é o país em que a democracia se confunde com um filme dramático.

Drama esse que se aprofunda com dados como o que veio à tona, também na última sexta-feira: em junho, o Índice de Preços ao Consumidor (IPCA) teve deflação de 0,23%, a primeira em 11 anos, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Muitos podem pensar que esse seria um dado positivo. Mas não é, principalmente pelo fato de estarmos na pior recessão da história.

Explicando rapidamente, ao contrário da inflação, que é a alta dos preços, a deflação significa que os mesmos estão caindo. Um dos principais fatores para isso é a recessão e a crise, já que com baixa atividade econômica e as pessoas comprando menos, as empresas passam a reduzir os preços. E isso em série puxa a economia para baixo. Agravante: possibilidade de ainda mais desemprego.

É um dado que mostra que, nesse quase um ano e meio de governo Temer, a receita que se tem aplicado na área econômica parece não ter surtido efeito. Por mais que o governo tente mostrar alguns dados positivos, a verdade é que no macro as coisas podem estar piores do que antes. A impressão que se tem é que apenas os especuladores da Bolsa de Valores ganham com isso, e olhe lá!

Por isso causa certo temor que Rodrigo Maia venha a ser o presidente e aprofunde uma política econômica errática, que atenda a interesses pouco claros e de personagens manjados.

E cabe aqui ressaltar: assim como Temer, Maia não tem legitimidade para ocupar a Presidência da República. Aliás, o deputado carioca tem dupla ilegitimidade, já que sua eleição para o comando da Câmara não estava prevista no regimento interno da Casa, vez que ele já estava no comando e a reeleição para o posto é proibida.

Por isso mesmo continuo defendendo que a solução para nosso país é uma eleição direta, que legitime um presidente que possa conduzir reformas, que são sim necessárias, mas que precisam ter o apoio popular e não apenas que decretem que paguem a conta aqueles que menos tem. Um presidente eleito pelo voto popular, com um mandato de cinco anos, – sem direito à reeleição – teria o tempo e o apoio necessário para que o Brasil possa seguir em frente.

Entediado, o povo brasileiro espera o “gran finale” desse drama.

Paz e bem e ótima semana!

*Luiz Claudio Romanelli, deputado estadual pelo PSB, é líder do governo na Assembleia Legislativa do Paraná.