O trabalhador é quem vai pagar o pato

Luiz Claudio Romanelli*

“Se a liberdade significa alguma coisa, será sobretudo o direito de dizer às outras pessoas o que elas não querem ouvir”.
George Orwell

Não há o que celebrar neste 1º de Maio. O IBGE acaba de divulgar o recorde de trabalhadores desempregados no Brasil, 14.300.000. É apavorante, o estoque de mão de obra disponível atingiu o índice que era previsto para o final de 2017 ainda no quarto mês do ano, podendo chegar aos 15 milhões, uma verdadeira tragédia nacional.

Não bastasse esse cenário desolador, a Câmara dos Deputados acaba de aprovar a reforma trabalhista por 296 votos a favor e 177 contra. O texto-base segue agora para as demais votações. Foi uma grande derrota dos trabalhadores, justamente no momento em que estão mais vulneráveis pelos índices do desemprego.

O PSB encaminhou contra a reforma trabalhista e dos 30 deputados que votaram, 16 se posicionaram contra e 14 a favor. Os deputados federais paranaenses do partido, Luciano Ducci e Leopoldo Meyer, acertadamente votaram contra.

A opinião majoritária do partido que integro é que qualquer reforma trabalhista que promova a diminuição dos direitos conquistados, precarização e que estabeleça supremacia do negociado sobre o legislado é lesiva aos trabalhadores.

Os riscos de retrocesso nos direitos dos trabalhadores mobilizaram centrais sindicais, entidades representativas de varias categorias e até a Conferencia Nacional dos Bispos do Brasil. O secretário-geral da CNBB, dom Leonardo Steiner, afirmou que “o Brasil vive um momento particular de sua história, uma crise ética. Há situações de enorme complexidade nos quais estão envolvidos personagens do cenário político, sem falar da crise econômica que atinge a todos”, disse.

“Como encaminhar mudanças sem o respaldo da sociedade? Propostas de reformas que tocam na Constituição Federal, no sistema previdenciário, na CLT merecem estudo, pesquisa e aprofundamento”, afirmou.

A Frente Associativa da Magistratura e do Ministério Público do trabalho, composta por dezenas de entidades representativas de juízes e procuradores e que reúne mais de 40 mil juízes e membros do Ministério Publico emitiu nota oficial em que qualifica a reforma de “o maior projeto de retirada de direitos trabalhistas já discutido no Congresso Nacional desde o advento da CLT”.

Para a entidade, o projeto cria “novas formas de contratos de trabalho precários, que diminuem, em muito, direitos e remuneração, permitindo, inclusive, pagamento abaixo do salário mínimo mensal, o que concorreria para o aumento dos já elevados níveis de desemprego e de rotatividade no mercado de trabalho”.

O projeto aprovado pela Câmara dos Deputados traz inúmeros retrocessos. Atende apenas aos interesses de grandes empresários, como a Fiesp e seu pato amarelo.

O projeto prevê que o negociado prevalecera sobre a legislado. Patrões e empregados podem chegar a acordos coletivos na empresa independentemente do que prevê a lei trabalhista.

Em relação à jornada de trabalho, a jornada diária pode chegar até a 12 horas, e o limite semanal pode chegar a 48 horas, incluídas quatro horas extras. Atualmente, a jornada é de 44 horas semanais, com no máximo 10 horas por dia de trabalho.

O projeto reduz para 30 minutos o intervalo durante a jornada de trabalho. A contribuição sindical, hoje obrigatória, passa a ser opcional;

O dano moral será tarifado e o empregador saberá de antemão os valores mínimos e máximos que pagará de dano moral e poderá calcular o custo-benefício, Exemplo se um sistema de segurança custa R$ 100.000,00, será melhor deixar o empregado em local perigoso, pois se ele receber um salário mínimo a empresa pagará o máximo de R$ 46.850,00 de danos morais. (Vide novo artigo 223-G parágrafo 1º, inciso III, da CLT: – ofensa de natureza grave, até cinquenta vezes último salário contratual do ofendido).

A empresa poderá demorar até seis meses para compensar ou pagar as horas extras prestadas, mesmo sem autorização do sindicato, e por meio de um simples acordo individual. (vide art. 58 parágrafo 2º da CLT).

Se a empresa for vendida ela não será mais responsável pelas verbas trabalhistas, mesmo que você tenha trabalhado cinco anos para a antiga empresa e um dia na nova empresa. (novo art. 448-A da CLT: caracterizada a sucessão empresarial, ou de empregadores previstas nos artigos 10 e 448 dessa consolidação, às obrigações trabalhistas, inclusive as contraídas a época em que os empregados trabalhavam para empresa sucedida são de responsabilidade do sucessor).

Se você tiver formação superior e receber mais de R$11.062,62 não poderá questionar clausulas injustos do seu contato na justiça do trabalho. O seu contrato terá o mesmo valor que uma convenção coletiva firmada por sindicato. (Novo art. 444 parágrafo único da CLT: a livre estipulação a que se refere o caput deste artigo aplica-se às hipóteses previstas no art. 611-A dessa Consolidação, com a mesma eficácia legal, no caso do empregado portador de diploma de nível superior e que ele perceba salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social. Novo art. 611-A: A convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho tem prevalência sobre a lei quando, entre outros dispuserem….).

Gestantes e quem está amamentando poderão trabalhar em ambientes insalubres se isso for autorizado por um atestado médico. No caso das grávidas, isso só não será possível se a insalubridade for de grau máximo.

A rescisão contratual não precisará mais ser homologada em sindicatos.

A rescisão passa a ser feita na própria empresa, na presença dos advogados da empresa e do trabalhador.

O projeto prevê o fatiamento das férias em até três períodos.

O projeto institui a demissão em comum acordo. Por esse mecanismo, a multa de 40% do FGTS será reduzida a 20%, e o aviso prévio ficaria reduzido há 15 dias. Além disso, o trabalhador poderá sacar 80% do Fundo, mas perde o direito de receber o seguro-desemprego.

Em relação a ações trabalhistas contra a empresa, o trabalhador que representar fica responsabilizado pelo pagamento dos honorários periciais caso perca a ação. Hoje, ele não arca com custos que são cobertos pelo Poder Público. Agora, o benefício da justiça gratuita passará a ser concedido apenas aos que comprovarem insuficiência de recursos. O trabalhador também terá que pagar os custos processuais se faltar em um julgamento, salvo se comprovar, no prazo de oito dias, que o não comparecimento ocorreu por um motivo legalmente justificável.

Como alerta a entidade nacional dos juízes, o projeto “cria, a todo tempo, presunções de que o trabalhador age de forma ilícita e censurável na relação processual, colocando a empresa como ente sacrificado por essas ações”.

Que ninguém se iluda: a lei da terceirização, a reforma trabalhista e a reforma previdenciária, feitas sem o devido debate e sem participação popular, só vão contribuir para precarizar ainda mais as relações trabalhistas no Brasil. Como já alertei, mais uma vez a corda vai arrebentar do lado do mais fraco.

Boa Semana ! Paz e Bem!

*Luiz Claudio Romanelli é deputado estadual pelo PSB e líder do governo na Assembleia Legislativa do Paraná.