Renda de trabalho e capital já se equivalem, mas a desigualdade aumenta, diz Romanelli

“A renda do capital e trabalho já se equivalem, mas a desigualdade aumentou”, disse o deputado Romanelli (PSB) a respeito da pesquisa “A Distribuição e a Parcela da Renda Global do Trabalho” divulgada pela OIT (Organização Internacional do Trabalho) e registrada pelo Estadão em editorial desta quarta-feira, 28. “A distribuição de renda do trabalho é bastante assimétrica, ou seja, há uma grande desigualdade. Em 2017, os 10% mais dos trabalhadores bem pagos receberam 48,9% de toda a renda, enquanto os 10% mais pobres receberam apenas 0,1%”, disse Romanelli.

O jornal traz um resumo que indica os principais pontos registrados na pesquisa. Entre eles: no Ocidente, a diminuição da renda do trabalho em relação à do capital; a desigualdade da renda do trabalho é imensa – a metade mais rica recebe 93,6% do total e quanto mais os mais ricos ganham, menos ganha o resto, e quanto mais a classe média ganha, mais ganha a maioria, em especial os mais pobres.

Um outro padrão universal apontado pela pesquisa é de que os 80% de trabalhadores situados entre os 10% mais ricos e os 10% mais pobres – as classes médias – sofreram as maiores perdas com uma pequena parte de seus rendimentos transferida aos mais pobres e uma grande parte, aos mais ricos.

“Isso mostra a importância das políticas públicas que valorizem a relação entre o capital e o trabalho, mas que garanta direitos sem precarizar o trabalho, por meio da flexibilização das leis, e que os países desenvolvam modelos econômicos sustentáveis com o foco principalmente na redistribuição de renda, hoje muito concentrada como mostra a pesquisa”, completa Romanelli que participa nesta semana do seminário “centenário da OIT e o futuro do trabalho”.

Segundo Romanelli, a proposta da OIT apresentada nas discussões e debates do seminário é mais que necessária para garantir um futuro com justiça social. “Temos que construir o futuro do trabalho com empregos decentes para todos. Isso depende não só da conjuntura econômica, mas da vontade política porque muitas pessoas no mundo do trabalho estão muito aquém de suas expectativas razoáveis”, disse.

Leia a seguir, o editorial na íntegra.

A distribuição da renda do trabalho

A Organização Internacional do Trabalho acaba de publicar estatísticas inéditas na pesquisa A Distribuição e a Parcela da Renda Global do Trabalho. A “renda do trabalho” é o montante que as pessoas recebem pelo trabalho, em contraposição à “renda do capital”, valores recebidos pela propriedade de ativos como terras, máquinas, edificações, patentes, etc. Uma das novidades da pesquisa é uma nova metodologia que permite enfrentar o problema da heterogeneidade da renda dos autônomos, oriunda tanto do seu trabalho como do seu capital.

Entre 2004 e 2017 a renda do trabalho diminuiu enquanto a do capital aumentou. Em 2004, 53,7% da renda mundial advinha do trabalho e 46,3%, do capital. Em 2017 a renda do capital subiu para 48,6% enquanto a do trabalho diminuiu para 51,4%. Os responsáveis por esse declínio foram a Europa e a América. Nas quatro grandes economias americanas, a perda da renda do trabalho para a do capital foi acentuada nos EUA e ainda mais no México, enquanto no Canadá a proporção permaneceu estável. A exceção foi o Brasil, onde a renda do trabalho aumentou.

A distribuição da renda do trabalho, ainda que menos desigual que a do capital, é bastante assimétrica. Em 2017 os 10% mais bem pagos entre os trabalhadores receberam 48,9% de toda a renda do trabalho, enquanto os 10% mais pobres receberam apenas 0,1%. Os 50% mais pobres receberam meros 6,4%. Em outros termos, para ganhar o mesmo que a metade mais bem paga ganha em um ano, a metade mais pobre teria de trabalhar 14 anos. Apesar de tudo, nos últimos 15 anos a concentração diminuiu: em 2004 os 10% do topo recebiam 55,5% dos rendimentos, enquanto os 50% mais pobres ficavam só com 4,6%. Os principais fatores foram China e Índia. Ainda que nos dois países a concentração não tenha diminuído, o seu crescimento econômico reduziu a concentração global.

Um padrão tão revelador quanto trágico é que, quanto mais pobre um país, mais ele tende à desigualdade. Congo, Costa do Marfim, Libéria, Nigéria e Uganda são os países mais desiguais do mundo. Assim, “a renda do trabalho é desigualmente distribuída no globo tanto devido a diferenças na média por rendimento do trabalhador quanto por uma desigualdade maior nos países de renda média baixa,” diz a pesquisa.

Outro padrão universal é que os 80% de trabalhadores situados entre os 10% mais ricos e os 10% mais pobres – as classes médias – sofreram as maiores perdas, especialmente em economias desenvolvidas como EUA e Reino Unido, com uma pequena parte de seus rendimentos transferida aos mais pobres e uma grande parte, aos mais ricos.

Um terceiro padrão, conforme os pesquisadores, é que “aumentos nas parcelas dos 5% do topo estão associados a declínios para o resto da população”, ao passo que “aumentos na parcela mediana da renda do trabalho estão associados a aumentos em quase toda a distribuição”, beneficiando particularmente o extremo mais pobre.

Em resumo: i) no Ocidente a renda do trabalho diminuiu em relação à do capital; ii) a desigualdade da renda do trabalho diminuiu, mas ainda é imensa – a metade mais rica recebe 93,6% do total e os 10% mais ricos, que de resto têm muito mais capital, recebem quase metade de tudo; iii) quanto mais pobre um país, maior é a desigualdade; iv) as classes médias foram as que mais perderam renda nos últimos anos; e, finalmente, v) quanto mais os mais ricos ganham, menos ganha o resto, e quanto mais a classe média ganha, mais ganha a maioria, em especial os mais pobres.

Os estatísticos se resumem a constatar estes fenômenos, sem ponderar suas causas e correlações. Por exemplo: o empobrecimento aumenta a desigualdade ou a desigualdade aumenta o empobrecimento? Ou terão ambos uma causa comum? Cabe aos economistas investigar. Quanto aos gestores públicos, por mais incertos que sejam os meios, o fim é claro: buscar a prosperidade geral robustecendo a renda em declínio das classes médias em favor dos mais pobres.

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