Você é de esquerda ou de direita?

 

“A velha mídia perdeu o monopólio da manipulação. Agora, tem que concorrer com as mídias sociais”. (Luigi Bellodi)

Essas eleições fizeram ressurgir com intensidade nunca vista, desde a redemocratização do país, a polarização ideológica entre esquerda e direita. Graças às redes sociais, o que se vê é uma batalha entre eleitores do #elenão, posicionados à esquerda, contra os partidários do #ptnão, no campo oposto, da direita. Mas graças à enxurrada de fake news e a ausência total de debates, o que tem prevalecido é a desinformação.

Mas, afinal, como surgiram as definições de esquerda e direita e o que elas significam?

A separação entre esquerda, centro e direita nasceu na Assembleia Nacional francesa, em 1789 e diz respeito à posição que os representantes ocupavam. Os jacobinos ficavam à esquerda e também na parte mais alta do plenário, sendo por isso chamados de montanheses. Os moderados ocupavam o centro, ou a planície e à direita, posicionavam-se os aristocratas.

Quem estava à direita reivindicava diminuir privilégios da nobreza e do clero, a manutenção do poder da elite e medidas para o bem-estar individual. Já os jacobinos da esquerda, também pregavam o fim dos privilégios, mas apoiavam a luta pela igualdade e o bem-estar coletivo.

No livro “Direita e esquerda”, Norberto Bobbio distingue a esquerda da direita por meio de sua atitude diante da igualdade. “Há, de um lado, gente que acredita que os seres humanos são mais iguais que desiguais; de outro, gente que acredita que somos mais desiguais que iguais”, associando o primeiro à esquerda, enquanto o segundo estaria à direita.

Para o filósofo e escritor, a antítese entre esquerda e direita diz respeito aos valores, igualdade versus liberdade individual. “A diferença entre extremismo e moderação diz respeito aos métodos, enquanto a antítese entre esquerda e direita concerne aos valores. A diferença de valores é mais forte que a de métodos”, escreve.

Num artigo publicado na Carta Maior, em 2013, o doutor em Ciência Política pela Universidade de Brasília Antônio Lassance define: “o que diferencia a esquerda da direita sempre foi e continua sendo sua posição frente ao “status quo”, “ao que aí está”. A esquerda questiona e fustiga o “status quo” – alguns de modo mais radical, até revolucionário; outros, de forma mais moderada, reformista. Desde que incomodem o “status quo”, são esquerda.

Todos os que partem do princípio de que “um outro mundo é possível”, como se diz no Fórum Social Mundial, são esquerda. A direita, ao contrário, é defensora do “status quo”, mesmo que, para isso, precise, paradoxalmente, destruir o mundo que a rodeia”.

Ele explica que, em suma, “esquerda e direita, assim como paralelos e meridianos, são formas de esquadrinhar o espectro político e posicionar atores e organizações conforme sua orientação em relação ao mundo. O que nos falta, muitas vezes, é ajustar nossas convenções e os critérios que permitam localizar no mapa tais referências.

Nem todos os atores e organizações necessariamente estão no campo da esquerda ou da direita. Em geral, aliás, esquerda e direita são minoritários. Além dos que estão no centro do espectro político e dos transversais, há uma imensa multidão que simplesmente não tem posição política definida. São contingentes sob disputa, muitas vezes ausentes do debate e alheios à política”, analisa Lassance.

No vale tudo em que essa campanha eleitoral se transformou, esse enorme contingente de alheios à política tornou-se o grande alvo da manipulação da informação e dos truques da marquetagem digital.

Como revelou a jornalista Patrícia Campos Mello, da Folha de São Paulo, foi montada uma máquina de ”fake news” para manipular o eleitorado.

No artigo “Um país primitivo prestes a regredir mais”, publicado também na Folha, o jornalista Clóvis Rossi nos faz o alerta: “a catarata de ofensas e ameaças dirigidas contra Patrícia, após a publicação de sua reportagem, é a versão virtual da ”Kristallnacht”, a noite dos cristais, o ataque aos judeus na Alemanha nazista em novembro de 1938, efetuado pelos paramilitares das sinistras SA e, atenção, também por civis alemães. Por enquanto, é uma infâmia virtual, mas demônios liberados e estimulados não voltam para a garrafa”.

Lamentável que o TSE, que anunciou com pompa e circunstância a formação de uma força tarefa para combater as fake news, ainda no período pré-eleitoral, não tenha feito absolutamente nada para combater esse crime eleitoral. Em diversos artigos publicados nessa mesma coluna, escrevi sobre o efeito da fake News na campanha americana, no brexit e no que poderia influenciar em nosso processo eleitoral.

Aliás, os Gestores do aplicativo WhatsApp diziam que não havia controle e, de uma hora para outra, baniram 300 mil contas do aplicativo.

O que fica dessas eleições é a certeza de um país dividido, nós e eles, a incerteza provocada pelo ódio generalizado e como certo, perspectiva de longos anos de turbulência.

Boa Semana! Paz e Bem!

*Luiz Cláudio Romanelli, advogado e especialista em gestão urbana, ex-secretário da Habitação, ex-presidente da Cohapar, e ex-secretário do Trabalho, é deputado pelo PSB. Escreve sobre Poder e Governo.