Ninguém é obrigado a ser político ou servidor público, mas se for, não reclame!

Esta semana, a ministra dos Direitos Humanos, Luislinda Valois, enviou solicitação ao governo para acumular salário de ministra com a aposentadoria de desembargadora, num total de R$ 61 mil. Ela recebe por mês R$ 30.400 pela aposentadoria de desembargadora do Tribunal de Justiça da Bahia. Como ministra, recebe R$ 3.300 já que as duas remunerações não podem ultrapassar R$ 33.700, que é o teto do funcionalismo público.

Entre as justificativas do pedido para acumular salários, a ministra disse que “o trabalho executado sem a correspondente contrapartida, a que se denomina remuneração, sem sombra de dúvida, se assemelha a trabalho escravo”.

Diante da repercussão extremamente negativa, ela desistiu de reivindicar o acúmulo dos salários.

Como escreveu o jornalista Paulo Moreira Leite, “num país onde a condição da mulher negra é uma tragédia social reconhecida pelas estatísticas e pelas cenas da vida cotidiana, na qual enfrenta a dupla opressão como mulher e como negra, em vez de ajudar no combate necessário ao preconceito e à discriminação, o comportamento da ministra apenas contribui para reforçar o que deveria ser eliminado e enfraquecer o que deveria ser fortalecido”.

Cito o caso da ministra porque tem sido recorrente a tentativa de setores especialmente do Judiciário, mas também do Legislativo e Executivo de manter e ampliar privilégios. Lamentavelmente, os interesses corporativistas tem se sobreposto ao interesse público. Num momento de economia em recuperação lenta, com mais de 12 milhões de desempregados e com um salário mínimo previsto de R$ 965 para 2018, o cidadão comum sente-se vilipendiado quando se confronta com salários e benefícios de certas castas funcionais- que até podem ser legais, mas certamente são amorais. Pior que muitos adotam certas ações e posturas que se arrogam poderes de infalibilidade. São os que vivem no andar de cima e se consideram semideuses, ou uma casta superior.

Como regra geral, as pessoas reclamam muito, sempre insatisfeitas. Ouço muitas queixas e reclamações de prefeitos, vereadores, deputados, juízes, promotores, desembargadores, servidores públicos. E costumo repetir que ninguém é obrigado a disputar uma eleição ou a prestar concurso público. Mas uma vez que escolheu esse caminho, deve desempenhar sua função de forma intensa, porque tem a obrigação de retribuir com trabalho sério e comprometimento o salário que o povo lhe paga. Não é uma pecúnia, é obrigação de todos trabalhar muito e intensivamente.

Os servidores públicos são profissionais que possuem um vínculo de trabalho profissional com órgãos e entidades do governo.

O término do período probatório, adquirida a estabilidade, não quer dizer que o servidor não deva se empenhar ainda mais para cumprir aquilo que é atribuição da função ou do cargo público que exerce.

Os deveres dos servidores consistem em um conjunto de regras comportamentais impostas. São obrigações pessoais inafastáveis de fazer aquilo que se deve. Por outro lado, as proibições são justamente o oposto, ou seja, o dever de não agir. São normas que prescrevem a proibição da prática de determinadas condutas.

Dentro do setor público, todas as atividades do governo afetam a vida de um país. Por isso, é necessário que os servidores apliquem os valores éticos para que os cidadãos possam acreditar na eficiência dos serviços públicos.

Existem normas de conduta que norteiam o comportamento do servidor, dentre elas estão os códigos de ética municipais e o Código de Ética da Administração do Poder Executivo Federal. No Paraná, o Estatuto dos Funcionários Civis do Paraná, prevê os direitos e deveres dos servidores e determina penalidades a quem descumprir as normas.

Assim, é missão deles serem leais aos princípios éticos e as leis acima das vantagens financeiras do cargo e ou qualquer outro interesse particular.
Esses interesses podem ser os desvios de verbas públicas, políticos que se beneficiam de programas e situações para ganhar votos, produção de leis que vão contra os princípios da sociedade, corrupção, etc.

As próprias leis possuem sanções e mecanismos que penalizam servidores públicos que agem em desacordo com suas atividades, um exemplo é a Lei de Improbidade Administrativa.

Os códigos de ética dos servidores são um conjunto de normas que dizem respeito à conduta dos servidores dentro de seu serviço, além de penalidades a serem aplicadas pelo não cumprimento dessas normas.

Os códigos informam os princípios e deveres dos servidores públicos como decoro, zelo, dignidade, eficácia e honra, além de outras qualidades do servidor, suas obrigações que visam o bem estar da população, bem como as proibições e punições derivadas do serviço irregular de suas funções, que relembram os princípios fundamentais da administração pública.

Ao lado do legitimo direito de reivindicar melhorias salariais e avanços nas carreiras profissionais que assegurem dignidade, os servidores não podem deixar de lado o interesse público.

Nos últimos tempos tem me assombrado o que se acostumou a ser visto como “mimimi” de pessoas que livremente escolheram uma carreira, seja de agente político ou público, civil ou militar. Políticos e servidores públicos tem que trabalhar e parar de reclamar, ou que procurem outra coisa para fazer na vida.

Em tempo: já havia concluído o artigo quando vi estarrecido a decisão da Dona Carmem Lúcia sobre a prevalência da liberdade de expressão em relação a dignidade da pessoa humana que é o macro fundamento do Estado brasileiro. É o valor-fonte a determinar a interpretação e a aplicação da Constituição. Aos que pensam ao contrário, recomendo a leitura do seguinte artigo científico: liberdade de expressão versus direitos fundamentais.

Boa Semana! Paz e Bem!

*Luiz Cláudio Romanelli, advogado e especialista em gestão urbana, ex-secretário da Habitação, ex-presidente da Cohapar, e ex-secretário do Trabalho, é deputado pelo PSB e líder do governo na Assembleia Legislativa do Paraná. Escreve às segundas-feiras sobre Poder e Governo.