A quarta-feira, dia 25 de setembro de 2017, ficará marcada na memória dos brasileiros como um dia da infâmia. Denunciado pela segunda vez por corrupção, por supostamente ter recebido propinas pagas pela JBS, Michel Temer teve o apoio de 251 deputados federais e a Câmara dos Deputados barrou o prosseguimento da denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR). Há quem calcule que a operação para salvar Temer custou mais que a emenda da reeleição de FHC ou da aprovação dos cinco anos para o Sarney pela constituinte de 1988.
O país assiste indignado e paralisado a violação dos princípios do Estado Democrático de Direito. Como explicar que Delcidio Amaral tenha sido preso pelo STF e mantido preso pelo Senado. Já o senador Aécio Neves que havia sido suspenso do mandato e tendo sido determinado o seu recolhimento noturno, reassumiu plenamente o mandato no Senado.
Como explicar que o Senado cassou o mandato do primeiro enquanto a denúncia contra o segundo foi arquivada? Como explicar que um presidente da República flagrado em transações nada republicanas permanece no poder, graças ao apoio conseguido na Câmara, sustentado numa agenda retrógrada, como a reclassificação do conceito do que seja trabalho escravo. Aliás a Justiça do Trabalho obrigou o Ministério do Trabalho a publicar, na última sexta-feira (27), a “lista suja” com 131 empregadores que submeteram empregados a condições análogas à escravidão. O documento pode ser acessado aqui neste link(http://trabalho.gov.br/images/Documentos/cadastro_empregadores_2017.pdf).
O país vive um caos político-institucional, com um presidente ilegítimo, um Congresso sob séria suspeição e um Judiciário que a cada dia perde credibilidade, especialmente o STF. A degradação moral no país é muito mais ampla e complexa do que parece.
O presidente mais impopular da história do país adotou uma agenda antipovo e governa de costas para os interesses da nação brasileira. Reportagem da Associated Press revela que o Banco Mundial calcula que cerca de 28,6 milhões de brasileiros saíram da pobreza entre 2004 e 2014. Mas a entidade também avalia que, em 2016, entre 2,5 milhões e 3,6 milhões de pessoas voltaram a viver abaixo do nível de pobreza – com menos de R$ 140 por mês.
A perniciosa reforma trabalhista onde o negociado prevalece sobre o legislado traz arrocho salarial. Um exemplo é um anuncio de vagas de trabalho para a Grande Vitória, no Espírito Santo, Salário de 4,45 a hora para jornada de 5 horas. R$ 22 reais por dia, somente apenas aos sábados e domingos, numa rede de fast-food.
O governo quer precarizar ainda mais as condições de vida dos brasileiros e promove o desmonte do estado de bem-estar social que o país estava construindo.
Na semana que vem Temer deve enviar ao Congresso o projeto que estabelece a modelagem da venda da Eletrobrás para acelerar a entrega do setor elétrico ao capital privado. Também deve entrar na pauta da Câmara o projeto que altera a lei dos planos de saúde, que vai penalizar as pessoas com mais de 60 anos.
A tal ponto estamos mergulhados na lama, que a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) manifestou na quinta-feira (26) mais uma vez sua apreensão e indignação com a grave realidade político-social vivida pelo país.
Segundo nota divulgada pelos bispos brasileiros, “ a apatia, o desencanto e o desinteresse pela política, que vemos crescer dia a dia no meio da população brasileira, inclusive nos movimentos sociais, têm sua raiz mais profunda em práticas políticas que comprometem a busca do bem comum, privilegiando interesses particulares. Tais práticas ferem a política e a esperança dos cidadãos que parecem não mais acreditar na força transformadora e renovadora do voto. É grave tirar a esperança de um povo. Urge ficar atentos, pois, situações como esta abrem espaço para salvadores da pátria, radicalismos e fundamentalismos que aumentam a crise e o sofrimento, especialmente dos mais pobres, além de ameaçar a democracia no País”.
Enquanto isso a ONG Chilena que criou o “latinobarómetro” constatou que entre os 18 países pesquisados o Brasil tem a pior democracia, atrás mesmo da Venezuela que a maior parte dos governos e da mídia ocidental classifica como ditadura. O interessante é que a insatisfação não é com a democracia como forma de governo, pois 62% a consideram como a melhor forma de governo (já esteve em 30% em 2001, penúltimo ano do governo FHC). Para 97% dos brasileiros a percepção é que se governa somente para grupos poderosos.
A CNBB, no entanto, acredita que o protagonismo popular pode mudar o rumo do país. “Apesar de tudo, é preciso vencer a tentação do desânimo. Só uma reação do povo, consciente e organizado, no exercício de sua cidadania, é capaz de purificar a política, banindo de seu meio aqueles que seguem o caminho da corrupção e do desprezo pelo bem comum. Incentivamos a população a ser protagonista das mudanças de que o Brasil precisa, manifestando-se, de forma pacífica, sempre que seus direitos e conquistas forem ameaçados”.
Acredito que o Brasil terá que vencer suas contradições. Como os bispos, acredito que só uma reação do povo, consciente e organizado, no exercício de sua cidadania, é capaz de purificar a política e restaurar a esperança das pessoas.
Boa Semana! Paz e Bem!
*Luiz Cláudio Romanelli, advogado e especialista em gestão urbana, ex-secretário da Habitação, ex-presidente da Cohapar, e ex-secretário do Trabalho, é deputado pelo PSB e líder do governo na Assembleia Legislativa do Paraná. Escreve às segundas-feiras sobre Poder e Governo.