Os fatos das últimas semanas no país atropelam qualquer senso de racionalidade, e, a política — a arte de servir e prestar o bem às pessoas — pode ficar irremediavelmente comprometida ao ser constantemente criminalizada de forma vil e açodada. É uma quadra triste em que vivemos, e não há luz próxima que possa sinalizar uma solução construída no debate, sem o conflito extremado entre os atores políticos. O “nós contra eles” parece ter vencido esta etapa da vida pública brasileira.
Os que acompanham a minha trajetória e história de vida, sabem que sou otimista, que procuro sempre enxergar os fatos de maneira positiva e que acredito no diálogo como forma de resolução de conflitos, bem como na razão, acima das paixões. Mas confesso que diante de tudo que acontece no país, diante do radicalismo, dos discursos exacerbados das manifestações nas ruas, da atuação do Judiciário, do clima de vale-tudo no Congresso Nacional, o sentimento é de preocupação e perplexidade.
É claro e evidente que todos os mal feitos e os mal feitores, independente de partidos, devem ser punidos de forma exemplar pela Justiça e pelo voto, mas também que a cobrança pela punição não pode empurrar o país ao retrocesso que já foi vencido na luta democrática e nas urnas. Faço minhas as palavras do meu dileto amigo Michele Caputo Neto que diz “roubo, autoritarismo, violência e incompetência têm o mesmo tamanho, seja de direita ou de esquerda. Ética, decência e competência não são patrimônios ideológicos, são de cunho moral de formação”. A operação Lava Jato conseguiu trazer de volta ao país, com os sem números casos de corrupção, sentimentos há tempos esquecidos.
E esse deve ser o tom do debate. De um lado ou do outro, direita ou esquerda, tudo deve ser apurado e compartilhado, com uma construção coletiva da transparência entre a sociedade civil e o poder público, de forma que todos, por meio de informação livre de manipulação, possamos exercer maior controle sobre as ações do poder público, pois o que preocupa e está em jogo, é o futuro da democracia brasileira e do Estado Democrático de Direito.
Na semana passada, por exemplo, me posicionei contrariamente à condução coercitiva do ex-presidente Lula para depor. Lembrei que o Código de Processo Penal estabelece que um juiz pode determinar que investigados ou réus sejam levados à força para serem ouvidos em audiência. Mas, para isso, é preciso que a testemunha ou o acusado tenham deixado de comparecer a uma audiência sem motivo justificado.
Agora foram as escutas legalmente feitas que podem ter se transformado em “grampos”, que incendiaram o debate, incluindo a desastrada tentativa de blindar o ex-presidente Lula, Ministro de Estado, para por hipótese escapar da caneta pesada do Juiz Moro. Devido processo legal, garantias constitucionais, servem para o Lula, servem para qualquer um de nós.
A minha interpretação é a mesma que a do ministro Marco Aurélio Mello, do STF, e do professor emérito da USP, Dalmo Dallari. “Quando se potencializa o objetivo a ser alcançado em detrimento da lei, se parte para o justiçamento, e isso não se coaduna com os ares democráticos da Carta de 1988 (Constituição)”, disse Marco Aurélio de Mello. Considerado um conservador, o juiz Antonin Scalia, da Suprema Corte americana, sempre dizia que a “Constituição é para ser lida e cumprida, não interpretada pelo judiciário”.
Considero que a Operação Lava Jato é de extrema importância e poderá fazer um trabalho relevante para o país. Isso é indiscutível. Mas assim como todos são iguais perante a lei, os procuradores e juízes que agem a favor do interesse público, têm que estar sujeitos ao ordenamento jurídico. Não podem rasgar a Constituição.
Sei que não há muito espaço para este tipo de debate na sociedade e no parlamento e até em setores da imprensa. Mas neste domingo, 20, como sempre faço, postei no facebook o que chamo de “ensinamentos da minha mãe”. E nessa postagem, reiterei que o momento tem muitos desafios e que a minha mãe me ensinou que a vida é feita de ciclos, que se abrem e fecham de acordo com as escolhas, fazendo com que possamos desenvolver novas habilidades a cada desafio vencido. Quando se atravessa um ciclo que apresenta mais dificuldades que o habitual, não se deve se entregar até que o mesmo seja vencido.
A nossa força interior é inata, e desenvolvê-la é o maior desafio, pois a cada dia temos que nos reinventar, para buscar o bem estar de todos que amamos e que fazem lutar pelo que acreditamos.
Uma boa semana, saúde e paz, e uma Feliz Páscoa à todos.